sábado, 19 de outubro de 2013

DOMINGO XXIX COMUM  Ano C

"E Deus não havia de fazer justiça aos seus eleitos, que por Ele clamam dia e noite…?” Lc 18, 7

Sem desfalecer

Há alguns anos um anúncio publicitário elogiava a duração de determinadas pilhas com um coelhito a tocar bateria, que no meio de outros láparos com o mesmo instrumento, se mantinha activo enquanto todos iam desistindo por falta de energia. “E dura, e dura, e dura…” era o slogan que ficava no ouvido. É curioso como em tantas coisas da vida, e algumas a que chamamos importantes, o comum é gastar-se a energia com o tempo, perder-se o encanto e o entusiasmo inicial. O certo é que é preciso recarregar as “pilhas”, renovar os compromissos, apontar para o essencial e assumir que há causas que não se podem abandonar, sob o risco de perdermos o mais importante. É aí que, como diz o meu amigo padre e desenhador José Luís Cortés, que os amigos são importantes: “As pilhas recarregam-se com uma “pilha” de amigos”!

Orar sem desfalecer” é um tema muito querido a São Lucas que o refere várias vezes. Mas a parábola de Jesus que hoje nos oferece aponta, sobretudo, a fome e sede de justiça que uma viúva (pobre ente os mais pobres) não se cansa de pedir a um juíz (“que não temia a Deus nem respeitava os homens”). E o tema da justiça é repetido quatro vezes no pequeníssimo relato. Não é um manual de oração o que Jesus oferece. Bem diferente de várias publicações “pseudo-religiosas”, que circulam pelos escaparates ou na internet, com orações para todas as circunstâncias, Jesus ensina a clamar pela justiça, a sintonizar com Deus por um projecto mais digno de sociedade. A oração de súplica encontra paralelo no clamor dos pobres, na perseverança em favor de quem é oprimido, e essa é uma causa que nenhum cristão pode abandonar. Daí que toda a oração tenha uma componente de transformação: da realidade, que desejamos mais justa e mais coerente com o próprio desejo de Deus; e de quem reza, que ao abrir-se a Deus reorienta as suas prioridades segundo o critério substancial do amor. Dizia o filósofo Platão: “Não há vento favorável para aquele que não sabe para onde vai”, e assim acontece para muitas realidades da sociedade, e também para quem faz da oração um auto-consolo ou uma alienação das responsabilidades, em vez de um diálogo que abre caminhos.

A perseverança é uma virtude que se cultiva. Muito diferente do fanatismo ou da intolerância, defeitos que endurecem e atrofiam o coração e a mente, a perseverança tem a sua força nas motivações. E quando o valor maior é a felicidade dos outros vale a pena lutar por ela. Revestida de sabedoria, apresentando objectivos realizáveis, e reconhecendo os pequenos progressos, ela lembra-nos que “o muito é sempre feito de pequenos poucos” (J.Luís Cortés).
Nestes dias de grande sofrimento económico e social é duro constatar que a perseverança parece ser exclusivamente da austeridade. Em que justiça poderemos encontrar motivações? Que perseverança nos é pedida? Que fé quer o Filho do Homem encontrar quando voltar, se não uma fé como a da viúva, comprometida na justiça e na verdade?
Padre Victor Gonçalves

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.